Ilógico
Por Luis Augusto Nobre, 01.junho.2009
Não imaginava que um dia fosse escrever algo sobre uma pessoa que estava em minha vida e, de repente, já não pertence mais a este mundo. O duro foi aguentar tudo isso longe de casa e dos amigos que a amavam tanto quanto eu.
Bem, o que dizer da Adriana? Primeiro, que vou sentir falta dos seus jargões: Ilógico, Caraças, Gente, Hilário. Até porque tudo o que você poderia imaginar de estranho ou inusitado, acontecia com a Dri. E o melhor era ver o sorriso, ouvir o riso e o som saindo e construindo a palavra: HI – LÁ – RI – O. Quando coisas esdrúxulas aconteciam comigo, logo vinha a voz, ou melhor, vem a voz dela na cabeça. Uma que veio de cara foi quando tive que fazer uma conexão em Nova York e esqueci de tirar os líquidos da bagagem de mão. O cara da revista deu um tapa na minha mão porque eu quis mexer na mochila antes dele, até para ajudar.
O buraco no peito está grande. O vazio é frio e não tem chão. Como vai ser o dia a dia sem a Adriana para conversar. Os almoços estranhos nas Americanas, a correria para pegar uma sessão de cinema depois do trabalho, a busca por ingressos. Como vamos viver sem o nosso contrabando de boa qualidade (mais uma história hilária dela).
Eu sempre memorizo a primeira vez que falo com uma pessoa. Lembro com riquezas de detalhes que chegam a assustar. Mas não consigo me lembrar de quando conheci a nossa Dri. Acho que é porque toda vez que saíamos, eu a estava conhecendo pela primeira vez. Sempre tinha algo novo na holandesa que chegou ao Brasil nos seus primeiros anos de vida; que morou no Rio de Janeiro sua vida inteira e que amava esta cidade; que passou uma temporada em Belo Horizonte; que sempre soube aproveitar a vida, com ou sem planejamento.
Jornalista como eu, Adriana não exercia a função. Mas fazia uma coisa muito bem: relacionar-se. Nunca vi ninguém com uma network e com uma “netfriends” tão grande. Conhecia todo mundo, fosse conduzindo comitivas, fosse numa pizzaria. Não havia ninguém que não se apaixonasse por ela. Aprendi muitas coisas com a moça de cabelos negros e olhar profundo.
Adriana também era moça de muitos segredos. O maior dele era a idade, que infelizmente descobrimos da pior forma possível. Recatada, ela não curtia dividir sua vida pessoal com qualquer um. Nunca demonstrava o que estava sentindo, por maior medo que tivesse. Não queria “intrusos”, mesmo que estes fossem grandes amigos e companheiros. Mas quem a conhecia um pouco mais, conseguia “ler” seus pensamentos e aflições.
Escrever estas palavras em um saguão de aeroporto, longe de casa, da família, e dos amigos, não é nada fácil. A vergonha de chorar em público. O medo de demonstrar sentimentos. País estranho. Pessoas estranhas. Lembro das várias vezes que falávamos sobre minha viagem. Melhor, sobre viagens.
Fiquei surpreso ontem, domingo, 31 de maio, quando li seu e-mail dizendo que ia para a Coréia do Sul. Fiquei chocado quando vi na TV, hoje pela manhã, a notícia sobre o desaparecimento do voo da Air France que saiu do Rio de Janeiro com destino a Paris e conexões. Logo tudo se conectou em minha cabeça. Estava para mandar uma mensagem perguntando sobre o voo da Adriana quando recebi outra dizendo que ela estava na aeronave. Na hora me veio uma das histórias dela, quando estava na Esso, na época do acidente com o Fokker 100 da TAM. Rezei para ela ter perdido o voo. Rezei para ser um engano. Rezei para que fosse falha mecânica e viesse a confirmação de que a aeronave posou em Paris no horário previsto. Rezei para que ela estivesse bem e em paz, onde quer que fosse.
Adriana tinha medo de voar, mas amava viajar. Ainda mais de surpresa. Decidia na quinta que viajaria para o Leste Europeu no domingo. Decidia dois dias antes que entraria de férias e iria passar o Natal com as irmãs na Holanda. Mas o medo era tão grande que chegava a segurar a mão do chefe durante uma turbulência (mais uma história).
A animação dela contagiava. A inocência também. Mas burra ela não era. Tinha inteligência acadêmica e da vida. Apesar dos tamancos holandeses e do sangue mineiro, sabia muito bem rodar a baiana. Não descia do salto, até porque não gostava. Mas sabia muito bem se impor. Voz firme e muita atitude.
Não sei se me perdi nas palavras, mas queria compartilhar com todos o que a mágica da Adriana fazia e ainda faz. Não sei se a expus, coisa que não gostava, mas quero que entendam este relato-desabafo como uma demonstração de carinho por uma mulher que me apaixonei (como amigo) desde o primeiro contato.
Adriana, onde quer que você esteja, saiba que vamos continuar a te amar (pelo menos, eu vou sempre amá-la).
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Um comentário:
Tenho certeza de que Adriana, onde estiver, gostou de saber que teve em vidas amigos como você, Louis! Relato lindo, em meio a tanta tristeza!
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